terça-feira, 5 de dezembro de 2023

Quantos eus que não são meus?

Exatamente um mês. Foi o tempo que levei para ler esse livro. Confesso que, nas últimas folhas eu dei uma boa enrolada. Isso porque não queria terminar. Eu me acostumo com os personagens ou, no caso desse livro, com a narração do Padre Fábio. Como se ele ficasse frente a frente comigo, falando o que escreveu. Então, se eu terminasse logo, não teria mais a companhia dele.  Mas, precisava terminar. Então peguei ontem e finalizei as últimas páginas.

Sobre o livro: Eu fiquei um pouco confusa porque esse assunto é complicado. O Padre Fábio sempre muito calmo e didático nas explicações. Falou sobre: indivíduo, pessoa, eu essencial, eu acidental. Mas eu vou ter que ler o livro novamente. Em outra oportunidade. Quem sabe eu entenda melhor.

Abaixo eu copiei vários trechos que achei interessante! Lógico que não dá para compreender sem ler o livro inteiro. Mas fica como aperitivo.


Enrolei... Faltando algumas folhas

As maiores expressões artísticas que o mundo conheceu nasceram de homens e mulheres muito debilitados emocionalmente.
Pág. 122/123
Realmente, muitas poesias e músicas foram escritas a partir de um rompimento afetivo, de uma morte...

Estamos cada vez menos dispostos aos trabalhos emocionais, aos relacionamentos que nos solicitam êxodos e travessias. Temos imensa facilidade de descartar os que nos exigem muito. Queremos vínculos mais palatáveis, menos exigentes. Há uma indisposição natural aos enfrentamentos que poderiam resultar em vínculos mais estáveis e duradouros.
Pág. 147

O eu é um código de identidade, um conjunto de realidades humanas que nos torna únicos e irrepetíveis. Quando digo "este sou eu", refiro-me à minha verdade pessoal, ao estatuto que me difere de todos os outros eus que encontro durante o curso de minha existência. No avesso da afirmação há uma negação. Ao dizer que sou, naturalmente elimino muitas outras possibilidades de eus que não são meus.
Pág. 158

Somos o que somos porque muitos nos partejaram. Eles não nos inventaram. Nós já éramos em potencial, mas eles contribuíram para que viesse à luz os seres que somos. É por isso que a honestidade intelectual nunca nos permite conjugar o que fazemos no singular. Somos a soma de muitos.
Pág. 193

Cada ser humano deve ser o legítimo administrador de sua verdade pessoal. Não é honesto derrubar sobre ombros alheios as responsabilidades de não termos sido quem poderíamos ser. Não cabe derramar culpas sobre pais, mães, tutores, professores, irmãos, amigos, por termos renunciado ao cultivo de nossa verdadeira essência, passando a estabelecer escolhas que nos distanciaram de nós mesmos. De nada vale chorar sobre o leite derramado. 
Pág. 195

O mundo passa por um empobrecimento cultural. Estamos presenciando o estrangulamento da sensibilidade artística, a prevalência da ignorância, do desconhecimento, da superficialidade. E nós reproduzimos a superficialidade do mundo nas pequenas coisas. Lemos cada vez menos e, quando lemos, optamos pela leitura fácil, pelo texto curto, simplório, que não nos incomodará com palavras desconhecidas, nem nos exigirá empenho intelectual para compreendê-lo. Somos a geração dos resumos, dos discursos breves, simplificados, da indisposição à complexidade, porque é naturalmente exigente. Estamos apressados, sempre apressados. A tudo nós aceleramos. As redes sociais estão nos condicionando e
condenando à brevidade. Ouvimos os áudios que nos enviam em velocidade máxima. Argumentamos que as pessoas são lentas, prolixas. Explicar com detalhe, característica que no passado nos soava virtuosa, pois denota um entendimento comprometido, agora é considerado defeito. Não escutamos mais a música inteira. Músicas de que gostamos. Ouvimos uma parte e já pulamos para outra. A ansiedade está no comando. Perdemos a capacidade de colocar a mente em estado de quietude, desaprendemos a mística do silêncio. Estamos cada vez mais indispostos aos rituais que nos humanizam, que nos equalizam, equilibram.
Pág. 227/228

Vivendo sob as máscaras que inventamos, nós sacrificamos a qualidade de nossa existência. O fingir ser outro, em detrimento do ser que podemos ser, causa enorme desgaste emocional ao ser humano que escolhe viver tão vergonhoso despropósito. Alguns perdem dias, meses e anos vivendo a vida sob disfarce. Outros perdem a vida inteira. Albergados sob o peso das máscaras, desperdiçam a preciosa oportunidade de ser quem são.
Pág. 270

Saber "quem se é" é um desafio que nunca termina, pois o ser que somos é prenhe de ineditismo, facetas que se revelam de acordo com as fases da vida. Como já abordamos, a vida humana é constante devir, remanso que recebe influências, contribuições; vazões, prejuízos planejados, articulados por nossa capacidade de amar; prejuízos impostos, sem que tenham sido escolhidos por nós, resultado de relações abusivas. Nós somos a soma de favorecimentos e desfavorecimentos. O eu que somos é um resultado construído por muitas mãos, muitas influências. Por isso é tão importante que sejamos vigilantes, atentos às circunstâncias que nos moldam.
Pág. 282

Somos a soma de todas as fases, os tempos idos, presentes e futuros. Os processos terapêuticos reúnem numa mesma sala todos os eus que compõem a trama do eu que somos. Eus que são nossos, eus que não são. Todos conjugados pelo mesmo verbo, orquestrados pela consciência, pela parte que, em nós, é capaz de compreender e esclarecer. A sala de estar em que reunimos os eus requer estar sempre iluminada. Para que tenhamos condições de distinguir o essencial do acidental, o indispensável do supérfluo Os eus que são meus, os eus que não são meus. Manter a luz acesa é uma tarefa que só terminará quando os nossos olhos se fecharem definitivamente.
Pág. 285

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