quarta-feira, 16 de março de 2022

O que de importante fiz na vida?


Um dia, durante uma conversa, me fizeram uma pergunta:

_ O que de importante você fez na vida?

A resposta me veio à mente na hora, mas não foi a que respondi, pois as circunstâncias não eram apropriadas. No papel de principal executivo da empresa onde trabalho, sabia que os assistentes queriam escutar anedotas sobre o meu trabalho.

Então, tirei lá das profundezas das minhas recordações, a narração da seguinte história:

O mais importante que fiz na minha vida ocorreu há poucos anos depois de formado.

Numa linda manhã resolvi pescar em um “pesque-e-pague” com um amigo que há muito não o via.

Conversávamos a respeito do que acontecia nas nossas vidas.

Ele me contava que sua esposa e ele acabavam de “ganhar” um bebê.

Passava já um bom tempo quando chegou o pai do meu amigo que, consternado, lhe disse que seu bebê parou de respirar e que foi levado para a Santa Casa com urgência. No mesmo instante, meu amigo subiu no carro do seu pai e se foi. Por um momento fiquei onde estava, sem pensar e imóvel, mas logo tratei de pensar no que deveria fazer:

_ Seguir meu amigo ao hospital? Minha presença, disse a mim mesmo, de nada serviria, pois a criança certamente está sob cuidados de médicos, e paramédicos, e nada havia que eu pudesse fazer para mudar a situação.

_ Oferecer meu apoio moral? Talvez, mas tanto ele quanto sua esposa vinham de famílias numerosas e sem dúvida estariam rodeados de amigos e familiares que lhes ofereceriam apoio e conforto necessários, acontecesse o que acontecesse. A única coisa que eu faria indo até lá, era atrapalhar.

Decidi que mais tarde iria ver o meu amigo. Quando dei a partida no meu carro, percebi que o meu amigo havia deixado o seu carro, todo aberto.

Fechei o seu carro e aí, então, parti até o hospital para entregar-lhe as chaves.

Como imaginei, a sala de espera estava repleta de familiares que os consolavam. Entrei sem fazer ruído e fiquei junto à porta pensando o que deveria fazer. Não demorou muito e surgiu o doutor Branquinho, médico e velho amigo, que se aproximou do casal e, em voz baixa, comunicou o falecimento do bebê.

Durante alguns instantes que ficaram abraçados - a mim pareceu uma eternidade - choravam enquanto todos os demais ficaram ao redor daquele silêncio de dor.

A mãe, ao notar a minha presença, correu para me abraçar e começou a chorar. Meu amigo também se refugiou em meus braços e me disse:

_ Muito obrigado por estar aqui!

Doutor Branquinho lhes perguntou se desejariam ficar alguns instantes com a criança. Durante horas fiquei sentado na sala de emergência do hospital, vendo meu amigo e sua esposa despedindo-se daquele lindo presente, que mal chegaram a “usufruir”.

Isso foi a coisa mais importante que me aconteceu e acabou mudando a minha vida.

Aquela experiência me deixou três lições:

Primeira: ela ocorreu quando aparentemente não havia absolutamente nada, mas nada que pudesse fazer. Nada daquilo que aprendi na universidade, nem nos anos em que exerci a minha profissão, nem tampouco a energia racional que utilizei para analisar a situação e decidir o que fazer, me serviu para aquela circunstância.

Segunda: estava convencido que o mais importante que já fiz na vida esteve a ponto de não ocorrer, devido às coisas que aprendi na universidade - conceitos racionais que aplicava na vida pessoal assim como na profissional. Ao aprender a pensar, quase me esqueci de Sentir. Hoje, não tenho dúvida alguma que devia ter subido naquele carro sem vacilar e acompanhar o meu amigo à Santa Casa.

Terceira: aprendi que a vida pode mudar num instante. Intelectualmente sabia disso mas acreditava que os infortúnios acontecem somente com os outros assim fazia os meus planos e imaginavam o futuro como algo tão perfeito e real como se não houvesse espaço para acidentes mas ao acordar de manhã percebi que perderam emprego sofrer uma doença ou cruzar com o motorista embriagado são acidentes que podem alterar este projeto chamado futuro em Um piscar de olhos desde aquele dia busquei o equilíbrio entre o trabalho e a sua vida aprendi que nenhum emprego por mais gratificante que seja compensa trabalhar até mais tarde perder férias romper um casamento ou passar um dia festivo longe da família aprendi que o mais importante da vida não é ganhar dinheiro endeusar-me numa carreira, aparentar-me fisicamente atraente, e nem ascender-me socialmente. O mais importante da vida é ter tempo para utilizar todos os conhecimentos adquiridos no sentido de promover o bem-estar do próximo.

Adaptação de Aulus Di Toam 

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