Semana passada me telefonaram de um jornal para pedir um depoimento sobre
mulheres que decidiram não ter filhos. Queriam um depoimento curto e rápido.
Sobre um tema tão intenso? Fui curta e rápida, mas agora vou me estender.
Tenho duas filhas planejadas e amadas, que nunca me provocaram um segundo
sequer de arrependimento. Mas nunca fui obcecada pela maternidade. Acredito que
qualquer mulher pode ser feliz sem ser mãe. Existem diversas outras vias para
distribuirmos nosso afeto, diversos outros interesses que preenchem uma vida:
amigos, trabalho, paixões, viagens, literatura, música - até solidão, se me
permitem a heresia. Conheço mulheres que se sentem íntegras e felizes sem ter
tido filhos, e mulheres rabugentas que tiveram não sei por que, já que só
reclamam. Há de tudo nesta vida.
Mas tenho pensado nesta questão porque, dia desses, uma amiga
inteligente, realizada e linda completou 50 anos e se revelou meio abatida por
certos questionamentos que chegaram com a idade - uma idade que está longe de
ser das trevas, mas que é emblemática, não se pode negar. Ela nunca quis ter
filhos. Escolha, não impossibilidade. Tem uma vida de sonho, mas ela anda se
perguntando: não tive filhos, será que fiz bem?
Ninguém tem a resposta. Mas é fácil compreender o dilema. Quando entramos
nos 30, o relógio biológico exige uma decisão: ter ou não? Algumas resolvem:
não. Criança dá trabalho, criança demanda muita atenção, criança é dependente,
criança interfere no relacionamento do casal, criança dá despesa, criança é pra
sempre. Tudo verdade, a não ser por um detalhe: crianças crescem. Crianças se
transformam em adultos companheiros, crianças são quase sempre nossa versão
melhorada, crianças herdarão não apenas nossos anéis, mas nossos genes, nosso
jeito, nossa história, e isso é explosivo, intenso, diabólico, fenomenal. Aos
30 só pensamos na perda da liberdade, mas aos 50 conseguimos finalmente
entender que a maternidade é muito mais do que abnegação, é uma aposta no futuro.
Depois dos anos palpitantes e frenéticos da juventude, chega uma hora em que
deixamos de pensar apenas no lado prático da vida para valorizar as conquistas
emocionais, que são as que verdadeiramente nos identificam.
Não estou fazendo a apologia da maternidade, sigo acreditando que todas as escolhas são legítimas. Mas optar por não ter filhos não é algo trivial. É uma experiência profunda que abriremos mão de vivenciar. É uma emoção que transferiremos para sobrinhos sem jamais saber como seria se eles tivessem sido gerados por nós. Vale a pena desprezar esse investimento de amor? Um investimento que, diga-se, é uma pedreira muitas vezes, não é nenhum mar de rosas? Nessas horas faz falta uma bola de cristal. O problema é se a dúvida vier nos atazanar mais adiante. A gente nunca sabe como teria sido se... É por isso que, neste caso, compensa queimar bastante os neurônios antes de decidir. Não dá para pensar no assunto levando-se em conta apenas o momento que se está passando, mas o contexto geral de uma vida. Porque não ser mãe também é para sempre.
Martha Medeiros - 08 de maio de 2005
Do livro "Liberdade Crônica", pág. 27 a 29
P.S.: Hoje comemora-se o "Dia das Mães"... E o meu aniversário. 🎉
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