Bom, você não foi. E não ligou. A mim, só restou
lamentar a sua falta de educação. Imaginando motivos possíveis. Será que você
não foi porque realmente não pôde ou simplesmente não quis? Será que não ligou
para não me magoar ou justamente o inverso disso?
Estou confusa, claro. Achava que você iria. Tanto que
eu aguardei sua chegada por mais minutos do que deveria, inventando desculpas
esfarrapadas para mim mesma. O trânsito, o horário, a meteorologia. Qualquer
pneu furado serviria. E até o último instante, juro, achei que você chegaria a
qualquer momento. Pedindo perdão pelo terrível atraso. Perdão que você teria,
junto com uma cara de quem está acostumada, e assim encerraríamos o assunto.
Mas você não foi.
Esperei outro tanto pelo seu telefonema, com todas as
esclarecedoras explicações. Para cada razão que houvesse, pensei numa excelente
resposta. Para cada silêncio, num suspiro. Para cada sensatez da sua parte,
numa loucura específica da minha.
Se você tivesse ligado do celular, eu seria fria. Se
tivesse ligado do trabalho, seria levemente avoada. Se a ligação caísse, eu
manteria a calma.
Foram muitos dias nessa tortura, então entenda que
percorri todas as rotas de fuga. Cheguei a procurar notícias suas pelos
jornais, pois só um obituário justificaria tamanha demora em uma ligação.
Enfim, por muito mais tempo do que desejaria, mantive
na ponta da língua tudo o que eu devia te dizer, e tudo que você merecia ouvir,
e tudo. Mas você não ligou. Mando esta carta, portanto, sem esperar resposta.
Nem sequer espero mais por nada, em coisa alguma, nesta vida, para ser sincera.
No que se refere a você, especialmente, porque o vazio do seu sumiço já me
preenche; tenho nele um conforto que
motivos não me trarão.
Não me responda, então, mesmo que deseje. Não quero um retorno; quis, um dia, uma ida.
Que não aconteceu, assim deixemos para lá
Estaria, entretanto, mentindo se não dissesse que,
aqui dentro ainda me corrói uma pequena curiosidade. Pois não é todo dia que
uma pessoa não vai e não liga, é? As pessoas guardam esses grandes vacilos para
momentos especiais, não guardam?
Então, eis a minha única curiosidade: você às vezes
pensa nisso, como eu penso? Com um suave aperto no coração? Ou será que você
foi apenas um idiota que esqueceu de ir?
Fernanda Young
P.S. Essa crônica saiu DAQUI!
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