Pois eu, esquecido dessa lição
elementar de filosofia, tentei ensinar queijo a quem nunca havia experimentado
um queijo... Tentei levar minhas netas a viajar pelo mundo da minha infância,
mundo no qual elas nunca estiveram.
Falei sobre casas de pau a
pique, fogões de lenha, minas d'água, monjolos, fornos de barro, galinhas
botando ovo, "casinhas" e penicos, cheiros de capim-gordura e bosta
de vaca, assombrações...
Queria levá-las a passear
comigo pelo mundo da minha infância na roça. Queria que fossem minhas companheiras.
Convidei-as então, a entrar na
minha máquina do tempo. Minha máquina do tempo é feita com memória e palavras.
Entrando na memória, eu voo para o passado. Escrevendo as minhas memórias, eu
levo outros a voar comigo. Foi isso que Proust fez ao escrever Em busca do
tempo perdido. Eu estava tentando voltar ao tempo perdido, para que ele não se
perdesse.
Acontece que acreditei demais
no poder das palavras.
Como poderiam as minhas netas
experimentar o meu mundo se elas nunca haviam estado nele?
Em "Se eu pudesse viver minha vida novamente", pág.72
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